Depois
da Santa Ceia, Cristo e seus discípulos deixaram o local onde a haviam promovido.
Atravessando-se o riacho de Cedrom. Sentou-se numa pedra e sentindo grande
agonia, chegou a suar sangue. Precisamos mais é entender porque nosso sofrimento
comparado ao d’Ele nada significa. Precisamos ter coragem para assumirmos a
nossa condição de fraqueza. E até mesmo diante da agonia a qual passou, Cristo
foi tentado e conseguiu com muito custo e fé até que fosse preso.
Repetimos
sempre as palavras de Cristo de várias outras maneiras: “Pai, se possível afasta
de mim este cálice” (Mc 14, 36). Dizemos: “Senhor, não queria sofrer”, “Senhor,
gostaria de saber porque sofro tanto”, “Senhor, porque eu sofro?”. Infelizmente
muito poucos têm coragem de completar a frase “Mas que seja feita a Tua vontade
e não a minha” (Idem). Isso é o que precisamos para dizer ao Pai, que a vontade
é D’Ele e não nossa.
Traído
por seu discípulo, sendo entregue aos chefes dos Sacerdotes, sofre até no
caminho por incompreensão dos seus próprios amigos. Pedro, em impulso corta a
orelha de Malco, o empregado do Sumo-Sacerdote. E acaba proferindo a famosa
frase que deu origem ao ditado popular: “Os que matam pela espada, por ela serão
mortos” (Mt 26, 52). Quando menos se esperava, os outros evangelistas nos dão
as pistas, todos os apóstolos começam a abandoná-lo, como que se dissessem com
sua fuga que o projeto de Deus estava começando.
Levado
aos sumos-sacerdotes, mais uma vez o jogo da política é uma das responsáveis por
levar o Salvador ao suplício. Com uma frase que muda todo o rumo das
negociações na Igreja, o condenado segue à delegacia. Pedro, do lado de fora
lembra-se do que recebeu de Cristo na última ceia e imensamente triste,
retira-se em humilhação total: “Antes que o galo cante, tu Me negarás três
vezes!” (Mt 26, 34). Levado diante da governadoria geral, o procurador romano,
Pôncio Pilatos.
Interrogado,
Jesus nos deixa de herança, a melhor forma de reagirmos aos julgamentos. Um
silêncio inteligente diante dos que não entendem a nossa missão diante do Reino
de Deus Pai. Pilatos fica intrigado ao querer saber “o que é a verdade” (Jo 18,
38), porém sem resposta, foi consultar o povo. Coração aflito, Jesus se prepara
para eminentemente seu sacrifício para a Redenção.
O
romano tenta de todos os jeitos aplacar a fúria da multidão que se concentra do
lado de fora do palácio. Cristo levado à presença das autoridades, rapidamente é
taxado de tudo, menos de santo. Pilatos então lhe aplica três golpes políticos
para tentar escapar da responsabilidade: o primeiro, surra de chicotes e
flagelos como punição para seu “crime” e depois seria solto, embora fraco. A
esposa de Pilatos, apelidada de Cláudia pelos apócrifos e por alguns historiadores,
sofrera em sonho na noite anterior por causa de Cristo e pedia ao marido para
que não fosse o responsável por sua condenação (Mt 27, 19).
Pela
opção do povo, persuadido pelos chefes dos sacerdotes, a saída que Pilatos
encontra é um segundo golpe, achando que o povo não libertará um prisioneiro
perigoso chamado Barrabás que está preso por ter se subvertido ao governo de
Roma. E o povo escolhe justamente o verdadeiro ladrão (Mt 27, 15-21). Símbolo da
cegueira do povo, Barrabás é o que é solto naquele dia. Cristo é então
preparado eminentemente para o sacrifício definitivo aqui deste ponto em diante.
O
terceiro e último golpe de Pilatos é chamado de “lavo minhas mãos”. Com uma
bandeja d’água, lava as mãos em sinal de irresponsabilidade diante do sangue de
Jesus (Mt 27, 24). E trazendo-lhe a condenação, duas horrorosas novidades para
a morte de cruz. A primeira, os condenados tinham que levar apenas o patíbulo
às costas (madeiro horizontal) e Jesus foi condenado, fraco como estava a levar
as duas peças, o patíbulo e a trave, que juntas, somavam um peso que se
necessitavam de mais de duas pessoas para carrega-la. Caindo por vezes sem
conta pela fraqueza física, Cristo é subjugado ao peso dos nossos pecados por
meio do instrumento do suplício.
A
julgar pela caminhada, o cenário não poderia ser diferente, uma pedreira fora
dos muros da cidade, chamada de Calvário (em hebraico Gólgotha). Cristo ainda preparava três fatos de grande ensinamento para
o grande momento; primeiro: perdoar seus assassinos durante sua execução (Lc
23, 34). Segundo: perdoar o ladrão que lhe pediu perdão (Lc 23, 43). Terceiro: Jesus
nos entrega sua mãe para ser a nossa mãe, começando por São João Evangelista (Jo
19, 26-27).
Cinco
dias antes, a mesma multidão que o acolhia em Jerusalém o mandava à morte, sem
entender que de um jeito ou de outro, a condenação não era de todo uma loucura,
era a vontade de Deus para o plano salvador da humanidade, embora muitos só
fossem notar que a Ressurreição só tomaria sentido após o martírio quando a
cruz começou a doer naqueles mais próximos a Ele.
A
segunda novidade é que os dois prisioneiros condenados com Cristo continuam com
o método tradicional, algumas tradições dizendo que receberam também a
crucificação por perda total de sangue por meio dos pregos, outras traduções acusam
que apenas Jesus recebera os pregos na crucificação.
A
política da época, ainda está presente neste momento, quando os mesmos que o
acusaram escarnecem dele usando as falsas assertivas para acusa-lo ainda em
execução. E aqueles que estavam ao redor nem imaginavam o tamanho da inocência
do crucificado. Usavam as mesmas palavras de Cristo usadas desta vez contra ele
próprio, só que sem fundamento algum, pois Ele falava em linguagem figurada
para fisgar os comentários desequilibrados alheios dos que não entendiam.
E
ainda um dos condenados teve forças para maltratar os outros dois supliciados. As
provocações de um lado e um pedido de perdão do outro (Lc 23, 39-43). A promessa
e a primeira salvação no calvário, São Dimas, apelidado pelos apócrifos pediu
perdão e ganhou o céu por seu coração ter se aberto no último minuto, mesmo que
em poucas horas de execução, já estava salvo.
Para
concluir, o preço pago foi alto demais para ninguém precisasse o pagar de novo.
E hoje, o que fazemos para preservar a memória deste acontecimento? Diante de
uma cruz na Igreja, às vezes não dizemos coisa com coisa, e nem mesmo nos
dirigimos como salvos pelo sacrifício maior. E deixamos a pergunta: Por Quê?
O
nosso coração deve ficar em silêncio total para que a morte d’Ele não tenha
sido em vão nesta sexta-feira santa e também no sentido de lhe relembrar e com Ele
participar de seu Calvário, sem nada reclamar, sem nada nos parecer melhor, sem
nada nos atrair para a tentação, apenas contemplar. Cantemos batendo no peito
como o fez Pe. Ximenes Coutinho e a Igreja na Semana Santa de 1975 quando foi
lançada a “Lamentação do Senhor”:
Povo
meu, que te fiz eu? Diz em que te contristei? Por que à morte me entregaste? Em
que foi que eu te faltei? Eu te fiz sair do Egito, Com maná te alimentei. Preparei-te
bela terra. Tu, a cruz para o teu Rei! Deus santo, Deus forte, Deus imortal, Tende
piedade de nós! Bela vinha eu te plantara, tu plantaste a lança em Mim.
Águas doces eu te dava, Foste amargo até o fim! Flagelei por ti o Egito, primogênitos
matei. tu, porém, Me flagelaste, entregaste o próprio Rei! Eu te abri o mar
Vermelho, tu me abriste o coração; a Pilatos me levaste, eu te levei pela mão. Só
na cruz tu me exaltaste, quando em tudo te exaltei. Que mais podia eu ter
feito? Em que foi que eu te faltei? (COUTINHO, 1975)
REFERÊNCIAS:
COUTINHO, Pe. J. Ximenes. Povo Meu. In: VÁRIOS. 1-B: Cantos
para a Semana Santa. São Paulo, Edições Paulinas Discos: 1975. (Disco) [Coleção
“Discos de O Domingo” – Série “ Caminho do Pai”].